terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Lavoisier - Um pouco de história da ciência

A história da ciência é fantástica. Apresento um trecho do livro Breve história de quase tudo, onde o autor Bill Bryson relata fatos da vida desse notável cientista.
[...] No século XVIII a química ainda encontrava-se na era da Alquimia. Era preciso alguém de visão para trazer a química à era moderna, e foram os franceses que forneceram essa pessoa. Seu nome era Antoine-Laurent Lavoisier. Nascido em 1743, Lavoisier era membro da nobreza inferior (seu pai adquirira um título para a família). Em 1768, comprou uma participação numa instituição profundamente desprezada denominada Ferme Générale (Fazenda Geral), que coletava impostos e taxas em nome do governo. Embora o próprio Lavoisier fosse, segundo os relatos, brando e justo, a companhia para qual trabalhava não era. Para começar, ela não taxava os ricos, somente os pobres, e muitas vezes arbitrariamente. O que atraiu Lavoisier à instituição foi o fato de ela fornecer os recursos para ele seguir sua principal devoção: a ciência. No auge, sua renda pessoal atingiu 150 mil libras por ano – uns 20 milhões de dólares em moeda atual.
Três anos após embarcar em sua carreira lucrativa, ele casou-se com a filha de catorze anos de um de seus chefes. O casamento foi um encontro de corações e mentes. Madame Lavoisier era dotada de um intelecto incisivo e logo estava trabalhando produtivamente com o marido. Apesar das exigências do trabalho e de uma vida social agitada, eles conseguiam dedicar cinco horas à ciência quase todos os dias – duas de manhã e três à noite -, bem como os domingos inteiros, que chamavam de jour de bonheur (dia da felicidade). Lavoisier também conseguiu achar um tempo para ser o comissário da pólvora, supervisionar a construção de uma muralha ao redor de Paris para deter os contrabandistas, ajudar a criar o sistema métrico e ser um dos autores do Méthode de nomenclature chimique, que se tornou uma bíblia na padronização dos nomes dos elementos.
Como membro destacado da Academia Real de Ciências, exigia-se dele um interesse ativo e informado nos assuntos em voga: hipnotismo, reforma penitenciária, a respiração dos insetos, o suprimento de água de Paris. Foi nessa função que, em 1780, Lavoisier fez certas observações depreciativas sobre uma nova teoria da combustão submetida à academia por um cientista jovem e esperançoso. A teoria estava realmente errada, mas o cientista nunca o esqueceu. Seu nome era Jean-Paul Marat.
Algo que Lavoisier nunca fez foi descobrir um elemento novo. Numa época em que parecia que qualquer um com uma proveta, uma chama e certos pós interessantes conseguia descobrir algo novo – aliás, dois terços dos elementos ainda estavam por ser descobertos -, Lavoisier não conseguiu descobrir um sequer. Certamente não foi por falta de provetas. Lavoisier possuía 13 mil naquele que era, num grau quase absurdo o melhor laboratório particular existente.
Seu equipamento sofisticado foi bastante útil. Durante anos, ele e madame Lavoisier ocuparam-se de estudos extremamente rigorosos que exigiam medições exatas. Eles descobriram, por exemplo, que um objeto que se enferruja não perde peso – uma descoberta extraordinária. De algum modo, ao se oxidar, o objeto atraía partículas básicas do ar. Foi a primeira percepção de que a matéria pode ser transformada, mas não eliminada. Se você queimasse este livro agora, sua matéria se transformaria em cinza e fumaça, no entanto a quantidade líquida de matéria no universo continuaria a mesma. Isso se tornou conhecido com a conservação de massa, e foi um conceito revolucionário. Infelizmente, coincidiu com outro tipo de revolução – a Revolução Francesa -, e nela Lavoisier estava de um lado totalmente errado.
Além de membro da odiada Ferme Générale, ele havia entusiasmaticamente construído a muralha que cercava Paris – uma construção tão detestada que foi a primeira coisa atacada pelos cidadãos rebeldes. Explorando esse fato, em 1791, Marat, então uma voz proeminente da Assembléia Nacional, denunciou Lavoisier e sugeriu que já passara da hora de ele ser decapitado. Logo depois, a Ferme Générale foi fechada. Não decorreu muito tempo até Marat ser assassinado por uma jovem ressentida chamada Charlotte Corday, mas aí já era tarde demais para Lavoisier.
Em 1793, o Reinado do Terror, já intenso, atingiu o paroxismo. Em outubro, Maria Antonieta foi mandada para a guilhotina. No mês seguinte, Lavoisier foi detido. Em maio, ele e 31 colegas da Ferme Générale foram levados ante o Tribunal Revolucionário (numa sala de audiência onde se destacava o busto de Marat). Oito foram absolvidos, mas Lavoisier e os outros foram conduzidos diretamente à Place de La Revolucion (atual Place de La Concorde), local da guilhotina mais ativa da França. Lavoisier observou seu sogro ser decapitado, depois subiu à prancha e aceitou o seu destino. Menos de três meses depois, em 27 de julho, o próprio Robespierre foi despachado da mesma maneira e no mesmo lugar, e o Reinado do Terror rapidamente se encerrou.
Cem anos após sua morte, uma estátua de Lavoisier foi erguida em Paris e muito admirada, até que alguém observou que não se pareia nem um pouco com ele. Ao ser interrogado, o escultor admitiu que usara a cabeça do matemático e filósofo marquês de Condorcet – aparentemente ele tinha uma de reserva – na esperança de que ninguém notasse a diferença ou, se notasse, que não se importasse. No segundo aspecto ele tinha razão. A estátua de Lavoisier-mais-Codorcet foi deixada no mesmo lugar por meio século, até a Segunda Guerra Mundial, quando, certa manhã, foi levada embora e fundida como sucata.[...]

Fonte: BRYSON, B. Breve História de quase tudo. São Paulo. Companhia das Letras, 2005. P 108-110.

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